domingo, 28 de setembro de 2025

Por Onde Andará Macunaíma?

espiã confessa

pedra que voa

depois que choveu pedra em São Francisco do Itabapoana no final de 2024, por ficarem sem saber se gelo ou granizo, alguns moradores da localidade do Macuco, resolveram instalar uma comissão popular de inquérito para apurar as causas do acidente.

Sabedores de que o significado da palavra Ita/bapoana é pedra que rola sobre o leito do rio, é bem possível que as “pedras” revoltadas com suas condições de viverem submersas podem ter sofrido gigantes mutações e serem transformadas em pedras que voam, incentivadas pelas bruxarias e alquimias desenvolvidas por alguns personagens do livro “Itabapoana Pedra Pássaro Poema”.

 

diante de tudo

que tenho falado

despido lido escrito

ser porta bandeira

não é uma missão

apenas por ter incorporado

a Mocidade Independente

de Padre Olivácio

     em Ouro Preto

tem mais angu nesse caroço

cabeça nesse prego

não nego

estou metida nessa trama

dos pés aos fios de cabelo

em cada uma das nervuras desse osso

debaixo dos lençóis de cada cama

tem segredos e mistérios

que sendo revelados

deixariam qualquer país em alvoroço

                            *

em vampiro goytacá

canibal tupiniquim

somos serAfim

todas nós somos

vampiras

numa página a gente transa

noutra página a     gente pira

 

Gigi Mocidade

Ex-Rainha da Bateria da Mocidade Independente de Padre Olivácio - a Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo

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a história nem conta onde o Conde D dava, porque a história é narrada pelos que se julgam vencedores, mas nem sempre isso é verdadeiro, Darcy Ribeiro por exemplo, gostava de se considerar um perdedor, pois segundo ele mesmo não cansava de afirmar que não se sentiria a vontade estando junto aos vencedores, das batalhas que ele travou durante toda sua vida em defesa do povo brasileiro.

 

Rúbia Querubim

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Bar do Firo

 

Gargaú

São Francisco de Itabapoana-RJ

 onde você come bebe e só paga a cerveja dona Beja não te engana quer comer peixe de graça só na pedra de Itabapoana


Irina Severina

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Onde está Macunaíma?

 

no poema na metáfora

no palco no livro

na tela do  cinema

no Acre na Amazônia

em Minas Bahia Pernambuco

Pará Sergipe Piauí

 Rio de Janeiro Espírito Santo

Macuaíma está em todo canto

Paraná Santa Catarina

até nas mais remotas

matas virgens  do Xingu

ou nas águas frias

do Rio Grande do Sul

ou nas termas quentes

do Rio Grande do Norte

Macunaíma vento forte

se misturou nas maravilhas

e também nas sutilezas

divina preguiça da beleza

das terras do bem virá

comeu o pão que o diabo amassou

quando se transmutou por São Paulo

no trampo do caos urbano

quase desapareceu do país

mas como um bom feiticeiro

seu pai não se enganou

te fez tornar-se encantado

para que o povo então  entendesse

as profundezas do teu  significado

 

                   Terra,

antes que alguém morra

escrevo prevendo a morte

arriscando a vida

antes que seja tarde

e que a língua da minha boca

não cubra mais tua ferida

 

Artur Gomes

dos livros : Suor & Cio (1985)

e Pátria A( r)mada - 2022

Por Onde Andará Macunaíma ?


 Gigi Mocidade - Eva já subiu a serra de Pacaraima? já viu o sol nascer na terra de makunaima? já beijou a pedra marco zero de Roraima? Piamã disse que não,  mas Irina já experimentou o experimental de Wally Salomão 

Federico Baudelaire - de onde estou em Itabira eu te pergunto Nilson Siqueira por onde andará Macunaíma? Eva Seiberlich não soube me responder se subiu serra do pacaraima ou beijou a pedra de muiraquitã, Cy a rainha mãe mato continua desfilando na Portela – Paulo Victor que esteve por algum tempo incorporando Macunaíma escafedeu-se tomou chá de sumiço com medo de Piamã com o seu descompromisso - preguiça só quem pode ter mesmo é o próprio Macunaíma. Já dizia Mário de Andrade em, seus delírios febris.

Ainda na Estrada frustrado por passar em Iriri e não encontrar a minha amada. Por onde andará Irina? que não é Macunaíma e só de sacanagem ou até sagaranagem, Rúbia me informa o paradeiro errado da minha andorinha azul, ela deve ter ido pro norte mas querubim me diz que foi pro sul, desfilar de porta/bandeira sem ensaio na mocidade independente de padre olivácio, no festival de Blumenau, aceitando o  convite do Pastor de Andrade o aliciador de ovelhas desencantadas. Só me resta conferir com Federika se ela foi mesmo para Blumenau ou foi se instalar em Vila Rica, depois de passar pelas praças de Bento. 

Itabapoana Pedra Pássaro Poema

 

era uma vez um mangue
e por onde andará Macunaíma

(Ainda estou aqui)

na sua carne no seu sangue
na medula no seu osso
será que ainda existe
algum vestígio de Macunaíma
na veia do seu pescoço?

tá no canto da sereia
no rabo da arraia
nos barracos da favela
nos becos do matadouro
na usina sapucaia?

na teoria dos mistérios

dos impérios dos passados

nas covas dos cemitérios

 desse brasil desossado?

macunaíma não me engana

bebeu água do paraíba

 nos porões dos satanazes

 está nos corpos incinerados

 na usina de cambaíba

 em campos dos goytacazes

macunaíma não me engana

está nas carcaças desovadas

na praia de manguinhos em

               são        francisco do itabapoana


Joilson Bessa me disse
Kapiducéu já ensaia
Macunaíma vem vindo
no Auto do Boi Macutraia

 

Artur Gomes

poema do livro

Itabapona Pedra Pássaro Poema

Litteralux – 2025

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quinzenalmente às segundas Por Onde Andará Macunaíma está na coluna que assino no canal ArteCult.com 

A Biografia de Um Poeta Absurdo

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quarta-feira, 17 de setembro de 2025

a poesia liberada de Artur Gomes - por Uilcon Pereira

Encontro Literário

Jovens Em Movimento

Poesia Literatura

Roda de Conversa 

Intervenções PoÉticas 

#poesia #literatura #intervençõespoéticas #encontroliterario #jovensemmovimento

#rodadeconversa

#BalbúrdiaPoÉtica

*

porta/bandeira 

 

diante de tudo

que tenho falado

despido lido escrito

ser porta bandeira

não é uma missão

apenas por ter incorporado

a Mocidade Independente

de Padre Olivácio

     em Ouro Preto

tem mais angu nesse caroço

cabeça nesse prego

não nego

estou metida nessa trama

dos pés aos fios de cabelo

em cada uma das nervuras desse osso

debaixo dos lençóis de cada cama

tem segredos e mistérios

que sendo revelados

deixariam qualquer país em alvoroço

 

Federika Bezerra

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           Jura secreta 18

 

te beijo vestida de nua
somente a lua te espelha
nesta lagoa vermelha
porto alegre caís do porto
barcos navios no teu corpo

os peixes brincam no teu cio
nus teus seios minhas mãos
as rendas finas  que vestias
sobre os teus pêlos ficção

 

todos os laços dos tecidos
aquela cor do teu vestido
a pura pele agora é roupa
o sabor da tua língua
o batom da tua boca
tudo antes só promessa
agora hóstia entre os meus dentes

 

e para espanto dos decentes
te levo ao ato consagrado
se te despir for só pecado
é só pecar que me interessa

 

Artur Gomes

Poesia Na Cama

Juras Secretas

Editora Pwenalux – 2018

 https://www.facebook.com/poesianacama



BraziLírica Pereira

: A Traição das Metáforas

 

certa vez em assombradado tive uma puta princesa do meu lado e a puta que pariu o presidente dos mil cheques tinha feito sua cama nos telhados da alvorada e a puta mãe depois foi descoberta vendendo alguns saquinhos de pó branco nas estradas vermelhas do planalto central de brazilíica lá pelas bandas da groelândia tupiniquim da bertolínia aziática onde nem pó de guaraná faz mais efeito estava escrito num para-choque de caminhão que trafegava pela estrada  na direção transamazônica

Biúte Jóia Pereira

https://www.facebook.com/ruidurbanos


 Pátria A(r)mada

www.porradalirica.blogspot.com 



               Teatro MultiLinguagens 


Nas mil e uma noites

que passei no teu encalço

vomitei  nas sobras dos finos  pratos

 

e as lâminas que afiei para raspar

as dobras dos teus  retratos

afinaram as solas dos meus sapatos

https://www.facebook.com/oficinapoesiafalada



quando Lady Gumes me deixou

cravou uma faca de fogo no meu peito

amarrada no bilhete

:

“Vais sentir o cheiro do meu sexo

Até o último segundo da sua vida”

 

Assinado

Gigi Mocidade  

https://www.facebook.com/gigimocidade/


Teatro do Absurdo

Afro-dite-se-quiser

Teatro do Absurdo 

Godot, produtor de farinha, recém chegado de Bom Lugar, que fica próximo a Barra do Itabapoana, passeava bêbado sem camisa ontem pela avenida principal de São Francisco e começou a gritar palavrões e palavrinhas quando viu essa miragem numa das vitrines de uma loja de inconveniências decorada para o natal.

 

Artur Fulinaíma

www.arturfulinaima.blogspot.com


Nação Goytacá

www.fulinaimargem.blogspot.com

COURO CRU & CARNE VIVA
Isso é um poema ou uma navalha?

Difícil a pessoa passar pela vida sem cometer poesia. Aquela paixãozinha, aquele namorico desfeito, aquela dor de cotovelo deixam a gente desamparado. E como psicanalista está caro e nem sempre fica bem buscar o consolo da mamãe, a gente corre depressa pro colo quente da poesia, fazendo uns versinhos que não conseguem ultrapassar os estreitos limites do eu apaixonado, do eu angustiado, do eu ferido.

 

Para a maioria das pessoas, poesia é coisa que dá e passa, principalmente na adolescência. Raros são aqueles que conseguem romper o exíguo círculo traçado em redor de si para entrar no terreno da verdadeira poesia.

A quase totalidade das pessoas que faz “poesia” julga que ser poeta é fácil. Um pouquinho de sentimento, uma frase iniciada com letra maiúscula, outras frases colocadas abaixo da primeira e ponto final. Pronto. Fiz um poema. Poeta que é poeta saque que fazer poesia não é mole mas consegue escrever um poema até quando a inspiração está efervescente no intestino e “não quer sair”. Preste só atenção em Drummond .

“Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira”.

Eis aí o Estado de Poesia, comoção lírica todos nós temos pelo menos uma vezinha na vida. Transformá-los em verdadeiros poemas é que são elas. Artur Gomes começou, como todo mundo, fazendo seus versinhos, mas desde o início, revelou um pendor incomum. A poesia para ele , era compromisso e não diletantismo ou fuga. Bem cedo, suas antenas sensíveis perceberam as misérias do mundo, particularmente as do em que ele vive, o terceiro. Sem armas brancas ou de fogo, impossibilitado de se transformar em guerrilheiro, ele fez da poesia, uma arma que cada dia afia mais.

Terceiro mundista, brasileiro e malandro, ele não quis saber de espada, cimitarra, alfanjes, floretes, sabres e alabardes para travar suas lutas. Em vez, preferiu a navalha que corta frio e fino, sem que a gente perceba, até o sangue começar a escorrer. E sua marca não sai mais. Os poemas de Artur Gomes cortam feito navalha e deixam uma cicatriz indelével que nem plástica remove. Implacável e habilidoso no manejo da sua arma , ele arremete contra os fabricantes de injustiças. Sua poesia revela preocupações sociais, políticas e ecológicas, não poupando os mitos forjados pela história. Além de contestador, iconoclasta.

Não se pense, porém que Artur Gomes vive mergulhado em profunda amargura. Ele sabe cantar também os prazeres do amor, do erotismo, a luxúria do ambiente tropical e o gozo pela vida. Sua poesia é também resistência à desfiguração cultural do nosso país.

 

Nem se pense também que a poesia em suas mãos, se reduz a um instrumento de protesto. Conquanto crítico e preocupado com o social, o político, e o ecológico, Artur Gomes demonstra também uma grande preocupação com questões técnicas. Artista, ele também é artesão. Trabalha seus poemas à exaustão, procura explorar as possiblidades da palavra e o suporte físico da página. Faz experiências no campo do concretismo, construindo poemas com palavras decompostas que só podem ser inteiramente compreendidas visualmente: a pá/lavra; re-par-tiu-se. Eis dois exemplos. Mas é fundamentalmente para o ouvido que se destinam os seus poemas. O espaço em que faz zunir e reluzir a sua navalha é sonoro e musical. O tempo passa e os poemas de Artur Gomes tornam-se cada vez mais musicais e ritmados.

Outro traço que se acentua na evolução do seu trabalho: a concisão. A cada livro publicado, nos deparamos com um poeta sempre mais econômico. Na linha de um Oswald de Andrade e de José Paulo Paes, ele escreve poemas curtos, enxutos, incisivos, que ferem como o diabo. Não rompe com a rima e com a métrica, mas não se deixa aprisionar por elas.

Ambas estão presentes o tempo todo em seu trabalho sem que se possa garantir que não sejam ocasionais. A rima, por exemplo quando rompe, traz um efeito inusitado. Tanque rima com ianque, parque rima com dark. E aqui há outro aspecto digno de registro: Artur Gomes incorpora as novidades, mas nunca fica deslumbrado com elas. É moderno muitas vezes experimentalista, mas respeita a tradição. Não sei de suas leituras, mas deve tomar bênção aos clássicos.

Não rompe com a métrica, com a rima e com a estrutura do poema, mas não cai na poesia convencional. É agressivo, mas não perde nunca de vista o sentido maior da poesia. Isso não quer dizer, em contrapartida, faça arte pela arte, mas muito menos significa que se deixa envolver nas facilidades da poesia de protesto feita sob encomenda.

O poeta está aí, inquieto, equilibrando-se na corda bamba. Pode começar a ler os seus poemas, leitor. Agora se você faz parte daquele grupo de pessoas que tiram partido da miséria e destruição, tome cuidado com Couro Cru & Carne Viva. Os poemas navalha de Artur Gomes certamente não terão piedade de você.

Aristides Arthur Soffiati
Campos, agosto de 1987

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Retalhos Imortais do SerAfim
https://secretasjuras.blogspot.com/

 Há uma passagem, em Auto do Frade, de João Cabral, que me chamou a atenção:

 

“- Fazem-no calar porque, certo

sua fala traz grande perigo.

- Dizem que ele é perigoso mesmo

falando em frutas e passarinhos.”

 

Vislumbro aí uma espécie de definição do alto poder transgressor da poesia, do poeta , da arte em geral: deixar fluir uma energia de protesto e indignação, crítica e iluminação da existência, qualquer que seja o pretexto ou o ponto de partida.

 

Por exemplo -: Suor & Cio, novo poemário de Artur Gomes. Na sua primeira parte (Tecidos Sobre A Terra) lemos um testemunho direto sobre as misérias e sofrimentos na região de Campos dos Goitacazes, interior fluminense. Não se canta amorosamente as lavouras de cana e grandes usinas, os aceiros e céus de anil. Ao contrário. Ouvimos uma fala que “traz grande perigo”, efetivamente ao denunciar – com aspereza e às vezes até com extremo rancor – a situação histórico-social, bruta e feroz, selvagem e primitiva, da exploração do homem no contexto do latifúndio e da monocultura.

 

“usina mói a cana

o caldo e o bagaço

usina mói o braço

a carne o osso”

 

Mas esta poesia dura, cortante e aguda, mantém igualmente a sua força de transgressão – continua revolucionária e perigosa – mesmo quando tematiza (principalmente em Tecidos Sobre A Pele, segunda parte do livro) as frutas, ou o prazer sexual, os seios, o carnaval, o mar, e os impulsos eróticos. Por detrás dos elementos bucólicos e parasidíacos (só nas aparências bem entendido), eis que explode o censurado o reprimido, o que não tem vergonha nem nunca terá:

 

“arando o vale das coxas

com o caule da minha espada

no pomar das tuas pernas

eu planto a língua molhada”.

 

Por isso, frequentemente os poemas se debruçam sobre o próprio ofício do poeta, e sobre o próprio sentido do fazer artístico, Ofício de Artista, experiência de poeta: presença do risco e da violação das normas injustas: carnavalizando, desbundando,a troup-sex, infernizando o céu e santificando a boca do inferno, denunciando o rufo dos chicotes, opondo-se aos donos da vida que controlam o saldo, o lucro e o tesão.

 

Os versos de Artur Gomes querem ser lidos, declamados, afixados em cartazes, desenhados em camisas. E vieram, para ficar nas memórias e bibliotecas da nossa gente, apesar do suor e do cio, e graças ao  suor e aocio:

 

“com um prazer de fera

e um punhal de amante”.

 

Uilcon Pereira

São Paulo, julho 1985

 

REVerso

 

Oswaldianamente

ainda não sei bandeira

nem levo o barco

ao rei da vela

 

: minha paixão

ainda é mangueira

desfilando na portela

 

SEIO DA TERRA

 

bem no centro do universo

te mando um beijo ó amada

enquanto arranco uma espada

do meu peito varonil

 

espanto todas estrelas

dos berços do eternamente

pra que acorde toda essa gente

deste vasto céu de anil

 

pois enquanto dorme o gigante

esplêndido sono profundo

não vê que do outro mundo

robôs te enrabam ó mãe gentil!

 

PARA Torquato Neto

                                        in memória

 

aqui estou na brasiléia tropicalha

em populácea militância

pornofágica

desbundando a marginalha

em poesia su-real

 

para esquecer que a circunstância

é um pouco trágica

e não dizer

que o meu brasil dançou geral


TRINCHEIRA

 

há uma gota de sangue

entre os meus olhos

                      e os teus

 

e muitas velas acesas

para salvar a nossa carne

e bocas cheias de dentes

mastigando a nossa morte

 

mas eles é que morrerão

meu amor : num grande susto

quando NUS virem

amando  nessa cama

de ferro e de pau duro

 

CORAÇÃO DE GALINHA

 

não sou tigresa

em tua cama

nem caviar em tua mesa

não sou mulher de fama

muito embora sempre tesa

 

não vim da boca do lixo

saí da pele do ovo

meu coração de galinha

virou orgasmo do povo

 

COITO

 

teu corpo é carne de manga

em meu pênis viril

enquanto sangra

quando beijo tua boca

                     enfurecido

rasgando por trás

          o teu vestido

 

COR DA PELE

 

árica sou: raíz e raça

orgia pagã na pele do poema

couro em chagas que me sangra

alma satã na carne de Ipanema

 

o negro na pele é só pirraça

de branco na cara do sistema

no fundo é amor que dou de graça

dou mais do que moça no cinema.

 

CARNE PROIBIDA

 

o preço atual

proíbes que me comas

mas pra ti estou de graça

pra ti não tenho preço

sou eu quem me ofereço

a ti: músculo & osso

leva-me à boca

e completa o teu almoço


OFÍCIO

 

ponho minha gema em tua blusa

para que pule no teu peito minha musa

toda tensão de ter tua pele em meu poema

 

meu ofício é de poeta

pra rimar poema e blusa

e ficar na tua pele

pelo tempo em que me usa

 

VOO SELVAGEM

 

com espada em riste

galopamos pradarias

e lutamos ferozmente

por dois segundos e meio

 

tua  fúria era louca

e agarrei-me em tuas crinas

para não cair na lama

 

mas o amor era tanto

e tanto era o prazer

quando fomos pra cama

não tinha mais o que fazer

 

ROSANA

 

nadar por sobre o peixe

dos teus olhos

e penetrar as profundezas

do teu útero

 

assim quando prepara

um outro nascimento

na escuridão

que a sua luz dê Flora

 

e com um membro teso

vazar a claridade

que em teus seios mora

 

 Artur Gomes

Suor & Cio

MVPB Edições – 1985


Relendo algumas cartas  antigas metáforas de fogo de uma deusa incendiária para aquecer o clima nessa manhã de chuva primavera entrou desaguando nuvens de algodão outubro ou nada por sobre as teias que aranhas tecem entre cogumelos e amoras azuis vermelhas olhos de sangue que bebi naquela carta que recebi na madrugada

Studio Fulinaíma Produção Audiovisual

https://www.facebook.com/studiofulinaima


COURO CRU & CARNE VIVA

 Isso é um poema ou uma navalha?

 Difícil a pessoa passar pela vida sem cometer poesia. Aquela paixãozinha, aquele namorico desfeito, aquela dor de cotovelo deixam a gente desamparado. E como psicanalista está caro e nem sempre fica bem buscar o consolo da mamãe, a gente corre depressa pro colo quente da poesia, fazendo uns versinhos que não conseguem ultrapassar os estreitos limites do eu apaixonado, do eu angustiado, do eu ferido. Para a maioria das pessoas, poesia é coisa que dá e passa, principalmente na adolescência. Raros são aqueles que conseguem romper o exíguo círculo traçado em redor de si para entrar no terreno da verdadeira poesia. A quase totalidade das pessoas que faz “poesia” julga que ser poeta é fácil. Um pouquinho de sentimento, uma frase iniciada com letra maiúscula, outras frases colocadas abaixo da primeira e ponto final. Pronto. Fiz um poema.  Poeta que é poeta saque que fazer poesia não é mole mas consegue escrever  um poema até quando a inspiração está efervescente no intestino e “não quer sair”.  Preste só atenção em Drummond .

 

“Gastei uma hora pensando um verso

que a pena não quer escrever.

No entanto ele está cá dentro

inquieto, vivo

e não quer sair.

Mas a poesia deste momento

inunda minha vida inteira”.

 

Eis aí o Estado de Poesia, comoção lírica todos nós temos pelo menos uma vezinha na vida. Transformá-los em verdadeiros poemas é que são elas. Artur Gomes começou, como todo mundo, fazendo seus versinhos, mas desde o início, revelou um pendor incomum. A poesia para ele , era compromisso e não diletantismo ou fuga. Bem cedo, suas antenas sensíveis perceberam as misérias do mundo, particularmente as do em que ele vive, o terceiro. Sem armas brancas ou de fogo, impossibilitado de se transformar em guerrilheiro, ele fez da poesia, uma arma que cada dia afia mais.

 Terceiro mundista, brasileiro e malandro, ele não quis saber de espada, cimitarra, alfanjes, floretes, sabres e alabardes para travar suas lutas. Em vez, preferiu a navalha que corta frio e fino, sem que a gente perceba, até o sangue começar a escorrer. E sua marca não sai mais. Os poemas de Artur Gomes cortam feito navalha e deixam uma cicatriz indelével que nem plástica remove. Implacável e habilidoso no manejo da sua arma , ele arremete contra os fabricantes de injustiças. Sua poesia revela preocupações sociais, políticas e ecológicas, não poupando os mitos forjados pela história. Além de contestador, iconoclasta.

 Não se pense, porém que Artur Gomes vive mergulhado em profunda amargura. Ele sabe cantar também os prazeres do amor, do erotismo, a luxúria do ambiente tropical e o goso pela vida. Sua poesia é também resistência à desfiguração cultural do nosso país. Nem se pense também que a poesia em suas mãos, se reduz a um instrumento de protesto. Conquanto crítico e preocupado com o social, o político, e o ecológico, Artur Gomes demonstra também uma grande preocupação com questões técnicas. Artista, ele também é artesão. Trabalha seus poemas à exaustão, procura explorar as possiblidades da palavra e o suporte físico da página. Faz experiências no campo do concretismo, construindo poemas com palavras decompostas que só podem ser inteiramente compreendidas visualmente: a pá lavra;  re-par-tiu-se. Eis dois exemplos. Mas é fundamentalmente para o ouvido que se destinam os seus poemas. O espaço em que faz zunir e reluzir a sua navalha é sonoro e musical. O tempo passa e os poemas de Artur Gomes tornam-se cada vez mais musicais e ritmados.

 Outro traço que se acentua na evolução do seu trabalho: a concisão. A cada livro publicado, nos deparamos com um poeta sempre mais econômico. Na linha de um Oswald de Andrade e de José Paulo Paes, ele escreve poemas curtos, enxutos, incisivos, que ferem como o  diabo. Não rompe com a rima e com a métrica, mas não se deixa aprisionar por elas. Ambas estão presentes o tempo todo em seu trabalho sem que se possa garantir que não sejam ocasionais. A rima, por exemplo quando rompe, traz um efeito inusitado. Tanque rima com ianque, parque rima com dark. E aqui há outro aspecto digno de registro: Artur Gomes incorpora as novidades, mas nunca fica deslumbrado com elas. É moderno muitas vezes experimentalista, mas respeita a tradição. Não sei de suas leituras, mas deve tomar bênção aos clássicos. Não rompe com  a métrica, com a rima e com a estrutura do poema, mas não cai na poesia convencional. É agressivo, mas não perde nunca de vista o sentido maior da poesia. Isso não quer dizer, em contrapartida, faça arte pela arte, mas muito menos significa que se deixa envolver nas facilidades da poesia de protesto feita sob encomenda.

 O poeta está aí, inquieto, equilibrando-se na corda bamba. Pode começar a ler os seus poemas, leitor. Agora se você faz parte daquele grupo de pessoas que tiram partido da miséria e destruição, tome cuidado com Couro Cru & Carne Viva. Os  poemas navalha de Artur Gomes  certamente não terão piedade de você.

 

Aristides Arthur Soffiati

Campos, agosto de 1987


A querida Pátria Amada  adormecida

agora acorda em mãos armadas

orientada por  genocida merdavalha

                  vamos cortar tua língua vil

               com  os meus fios de navalha

                esse brasil que come osso

          mora no abismo da mortalha

                     vamos degolar o teu pescoço

                     filho da puta vil canalha 



Artur Gomes 

fulinaimagens

www.fulinaimagens.blogspot.com

Por Onde Andará Macunaíma?

espiã confessa pedra que voa depois que choveu pedra em São Francisco do Itabapoana no final de 2024, por ficarem sem saber se gelo ou grani...